A Série B e as demonstrações por absurdo
Este texto tem como objetivo responder a seguinte pergunta: frente à queda do nível técnico do futebol nacional, o matemático Gauss, no auge de sua forma física, teria hoje espaço no elenco de um time que disputa a Série B do Campeonato Brasileiro masculino de futebol? Não, mentira, o objetivo é outro, mas até que seria divertido se fosse esse.
O Campeonato Brasileiro de futebol masculino da Série A tem nítidas vantagens sobre o da Série B. Os jogos da Série A são melhores de assistir, seja pelo nível técnico dos jogadores e dos times ou pelo horário mais amigável ao público. Particularmente para mim, um torcedor da Portuguesa que gostava de frequentar estádios, havia uma vantagem no fato do meu time estar na Série A junto com São Paulo, Corinthians, Santos e Palmeiras; pois contra estas equipes quando o mando de campo não é do meu time o jogo é na minha cidade (ou em Santos, que é bem perto) e eu posso ir ao estádio.
Por outro lado, jogos da Série B costumam ser mais vazios e isso traz um certo aconchego para o frequentador de estádios. Nos tempos em que eu acompanhei meu time na segunda divisão não era necessário pegar fila para comprar ingresso, dava tempo de comer um bolinho de bacalhau no caminho entre a bilheteria e a subida para a arquibancada, quando eu ia de carro era fácil parar no estacionamento dentro das dependências do Canindé e as chances de sair uma pancadaria eram menores. Eu não sentia esta tranquilidade nos jogos de Série A contra Corinthians, São Paulo, Santos e Palmeiras; talvez até por isso muitos dos torcedores destes times eventualmente vão ver jogos em estádios mais vazios, como os da Portuguesa e do Juventus, mas quase nenhum torcedor da Portuguesa tem interesse em ver jogos de outros times.
Aliás, uma vez eu até fui ver um jogo do Juventus na Rua Javari, mas para surpresa de muitos eu não gostei tanto assim. Muitos se perguntavam o porquê, já que os jogos do Juventus são muito parecidos com os da Portuguesa: muitos passes errados, falta de qualidade no domínio da bola, uns muitos idosos revoltados com o mau desempenho do time, outros poucos jovens também revoltados com o mau desempenho do time, comida típica, poucas filas e muito cimento disponível para se sentar. Mas é muito fácil entender por que a minha experiência na Rua Javari não foi a mais prazerosa, basta uma pessoa que torce para o Corinthians se perguntar o motivo de ela gostar de ver jogos do Corinthians e não gostar de ver jogos do São Paulo. No fundo jogos de times conhecidos como grandes são a mesma coisa: um monte de gente junta entoando cânticos, necessidade de chegar cedo, dificuldade pra ir embora quando sai todo mundo ao mesmo tempo, receio de atos violentos… Quem torce para o Corinthians se sujeita a tudo isso para ver um jogo do Corinthians, mas não para ver um jogo do São Paulo. Os exatos mesmos elementos que fazem esta pessoa gostar de ir ao Itaquerão ver um jogo do Corinthians (time bom, estádio cheio, torcida cantando, jogo emocionante) não fazem ela gostar de ver um jogo do São Paulo com estes mesmos ingredientes no Morumbi. Para mim pode ser a mesma coisa um jogo do Corinthians e um do São Paulo, mas para a torcida do Corinthians não é, por um simples motivo: um é o time deles e o outro não. De maneira análoga, para uma pessoa que torce para o Corinthians jogos do Juventus e da Portuguesa são a mesma coisa, mas para mim não são pelo mesmo simples motivo: um é meu time e o outro não. Evidentemente existe um fator de rivalidade entre Corinthians e São Paulo que não existe entre Portuguesa e Juventus que prejudica um pouco a analogia anterior, mas o fato é que para mim a Rua Javari não tem o encanto que tem para torcedores de outros times.
Outra vantagem da Série B em relação à Série A é a maior diversidade regional. Na Série A os times costumam ser mais concentrados nas mesmas cidades que conseguem quase sempre manter seus times na elite do futebol pela qualidade das equipes (ou pela ação dos tribunais de justiça desportiva, no caso das equipes cariocas). Já na Série B as equipes estão mais “espalhadas” pelo território nacional. Quando eu via jogos no estádio sempre tive ligeiras preferências por times sediados em cidades mais distantes, achava culturalmente mais enriquecedor ver meu time jogando contra um time de uma cidade que fica a 3000km da minha do que contra um time cuja cidade fica a 300km.
Um dia estava conversando com o meu pai (minha companhia nos estádios, juntamente com meu avô) justamente sobre como o fato de os jogos da Série B serem contra times mais dispersos no mapa tornava o campeonato mais interessante, porém tornava a competição mais difícil de ser acompanhada in loco. A conversa se passou justamente no intervalo entre dois jogos consecutivos fora de casa contra dois times com sedes muito distantes de São Paulo. Por algumas semanas, a única forma de acompanhar a Portuguesa no estádio seria viajando mais do 1.000km e meu pai se questionou se não era possível organizar um campeonato em que isso não acontecesse, ou seja, no qual todos os times jogam sempre um jogo fora e um em casa, nunca jogando dois jogos seguidos como visitante.
Antes de explicar o motivo de não ser possível tal formato de competição, é preciso esclarecer o formato de disputa das ligas nacionais de futebol. Para quem não está familiarizado com a forma de disputa do campeonato brasileiro masculino de futebol da Série B, desde 2006 o formato de disputa é o mesmo da série A e de muitas outras ligas de vários países: 20 times jogam entre si ao longo do campeonato, todos devem jogar contra todos; cada partida tem um time mandante e um time visitante, o time mandante tem o direito de escolher o local onde ocorrerá a partida; o campeonato se divide em duas fases, na primeira fase (também chamada de primeiro turno) cada equipe joga 19 vezes, uma vez contra cada uma das outras 19 equipes. Na segunda fase (também chamada de segundo turno) os 19 confrontos se repetem na mesma ordem, porém com os mandos de campo invertidos: se na primeira fase a Portuguesa jogou contra o Náutico no estádio da Portuguesa (em São Paulo), então na segunda fase o confronto entre as duas equipes será no estádio do Náutico (em Recife).
Para entender por que não é possível todos os times alternarem sempre o mando de campo, propus ao meu pai (e agora proponho a você) o seguinte exercício mental: imagine que vale a regra para todos os times de que sempre que um time jogar duas partidas consecutivas necessariamente uma será em casa e a outra fora de casa. Nessas circunstâncias a primeira rodada terá dez confrontos, com dez times mandantes (vamos dizer que estes times pertencem à Categoria A) e dez times visitantes (vamos dizer que estes times pertencem à Categoria B). Na segunda rodada os times da Categoria A jogarão como visitantes e os times da Categoria B como mandantes. Na terceira rodada os times da Categoria A voltarão a ser mandantes e os times da Categoria B voltarão a ser visitantes. Assim, os times da Categoria A seriam sempre mandantes nas rodadas ímpares (primeira, terceira, quinta, etc.) e visitantes nas rodadas pares (segunda, quarta, sexta, etc.), enquanto os times da Categoria B seriam sempre visitantes nas rodadas ímpares e mandantes nas rodadas pares. A pergunta a se fazer é: quando dois times da mesma categoria jogariam entre si? A resposta é nunca, o que segundo o regulamento do campeonato não pode ocorrer, pois todos os times têm que jogar contra todos os times. Sendo assim, com o regulamento vigente na Série B não é possível organizar uma tabela para um campeonato em que todos os times jogam entre si de forma que todos os times sempre alternem um jogo como visitante e o seguinte como mandante. Alguma hora algum time vai ter que jogar duas partidas seguidas como mandante ou duas partidas seguidas como visitante.
O que está por trás deste raciocínio? Em primeiro lugar alguns pressupostos foram estabelecidos:
1) Todo jogo tem um time mandante e um time visitante.
2) São disputadas 38 rodadas, cada uma com 10 confrontos.
3) Num mesmo turno, todos os times devem jogar contra todos.
4) No segundo turno são repetidos todos os confrontos, porém com os mandos de campo invertidos.
Caso alguma coisa esteja em desacordo com algum dos itens acima não é possível realizar o campeonato de acordo com o regulamento estabelecido.
Em segundo lugar foi feita uma afirmação hipotética:
É possível organizar o campeonato de forma que todos os times nunca joguem duas partidas consecutivas como mandante nem duas partidas consecutivas como visitante
Em terceiro lugar foi concluído que a veracidade da afirmação hipotética leva necessariamente a um cenário no qual times da mesma categoria nunca se enfrentam, algo que está em desacordo com um dos pressupostos, no caso o pressuposto número 3 (no qual é afirmado que todos os times devem jogar contra todos). Assim chega-se a uma situação chamada pelos matemáticos de absurdo, isto é, uma situação que está em desacordo com algo pré-estabelecido como verdadeiro.
Em quarto e último lugar a afirmação hipotética foi negada, o que nos leva a assegurar que o contrário da afirmação hipotética é verdadeiro, ou seja:
Não é possível organizar o campeonato de forma que todos os times nunca joguem duas partidas consecutivas como mandante nem duas partidas consecutivas como visitante
Assim funcionam as demonstrações por absurdo: uma afirmação é confirmada verdadeira quando o seu oposto leva necessariamente a uma situação absurda.
Para que os times nunca joguem duas partidas consecutivas como mandante nem duas partidas consecutivas como visitante é necessário criar outro regulamento, outra forma de disputa. Por exemplo: suponhamos que os 20 times sejam divididos em dois grupos (A e B) de dez times cada. Os times do grupo A jogam dez partidas contra cada um dos times do grupo B e vice-versa. Na primeira rodada as equipes do grupo A jogam em casa, na segunda rodada as do grupo B jogam em casa, na terceira rodada as do grupo A jogam em casa, na quarta rodada as do grupo B jogam em casa e assim por diante até a décima rodada, na qual o mando é dos times do grupo B. Ao final das dez rodadas o time que mais pontuou do grupo A joga uma final contra o time que mais pontuou do grupo B. A final é disputada em duas partidas, a primeira com mando do campeão do grupo A e a segunda com mando do campeão do grupo B. Somam-se os placares dos dois jogos da final e o vencedor é o campeão do torneio, em caso de empate na soma dos resultados realiza-se uma disputa de pênaltis.
Pronto! Temos aí um campeonato no qual os times nunca jogam duas partidas consecutivas como mandante nem duas partidas consecutivas como visitante, ainda que tal formato talvez não seja o mais justo de todos. Reparem que no novo formato o pressuposto número 3, o de que todos os times devem jogar contra todos, não vale. Assim a afirmação hipotética de que “É possível organizar o campeonato de forma que todos os times nunca joguem duas partidas consecutivas como mandante nem duas partidas consecutivas como visitante” não leva necessariamente a um absurdo e por isso não pode ser negada.
Na matemática, um dos casos mais conhecidos de demonstrações por absurdo é a prova de que a raiz quadrada de 2 não é um número racional, ou seja, não pode ser escrito como a divisão entre dois números inteiros. Para isso, são usados os mesmos passos usados na demonstração de que é impossível organizar o campeonato de forma que todos os times nunca joguem duas partidas consecutivas como mandante nem duas partidas consecutivas como visitante.
Em primeiro lugar são estabelecidos alguns pressupostos:
1) Um número inteiro elevado ao quadrado resulta em um número inteiro. Em outras palavras, se x é um número inteiro então x² também é um número inteiro.
2) Todo número que pode ser escrito como sendo o dobro de um número inteiro é um número par. Em outras palavras, se x pode ser escrito como 2y (onde y é um número inteiro), então x é um número par.
3) Se o resultado do quadrado de um número inteiro for par, então este número é par. Em outras palavras, se elevarmos um número inteiro x ao quadrado e o resultado x² for par, então x é um número par.
4) Toda fração possui uma forma irredutível. Em outras palavras, para toda fração existe uma fração equivalente a/b na qual o máximo divisor comum entre a e b é 1.
Em segundo lugar é feita uma afirmação hipotética:
Existe um número racional que elevado ao quadrado resulta em 2.
Em terceiro lugar vamos ver para onde esta afirmação hipotética vai nos levar. Vamos supor que exista este número racional cujo quadrado é igual a 2. Este suposto número racional tem que ter uma forma irredutível (pressuposto número 4), digamos que a forma irredutível do suposto número racional seja p/q, sendo p e q número inteiros.
Desenvolvendo um pouco a equação temos:
Sabemos que q é um número inteiro, então q² também é um número inteiro, de acordo com o pressuposto 1.
O número p² é o dobro de um número inteiro (p² é o dobro de q²), portanto p² é um número par, de acordo com o pressuposto 2.
Se p é um número inteiro e p² é um número par então p é um número par, de acordo com o pressuposto 3.
Se p é um número par então p pode ser escrito da forma p = 2n, sendo n um número inteiro.
Substituindo p por 2n na última equação temos:
Sabemos que n é um número inteiro, então n² também é um número inteiro, de acordo com o pressuposto 1.
O número q² é o dobro de um número inteiro (q² é o dobro de n²), portanto q² é um número par, de acordo com o pressuposto 2.
Se q é um número inteiro e q² é um número par, então q é um número par, de acordo com o pressuposto 3.
Se q é par e p também é par, então 2 é um divisor comum entre p e q. Esta constatação não está de acordo com o pressuposto número 4, segundo o qual o máximo divisor comum da forma irredutível de uma fração é 1. E aí está o absurdo: se existir um número racional cujo quadrado é igual a 2, este número racional não possuirá forma irredutível, o que não pode acontecer.
Por fim, em quarto lugar a afirmação hipotética é negada, o que nos leva a assegurar que o contrário da afirmação hipotética é verdadeiro, ou seja:
Não existe um número racional que elevado ao quadrado resulta em 2.
E assim prova-se que a raiz quadrada de 2 é um número irracional.
Demonstrações matemáticas são diferentes de campeonatos esportivos. Foi possível pensar num campeonato no qual não era necessário que todos os times jogassem contra todos, mas é muito mais difícil pensar numa fração que não tenha uma forma irredutível.
Conseguimos imaginar a elaboração de um regulamento eliminando um dos 4 pressupostos estabelecidos como verdadeiros no exemplo do regulamento da Série B, criando um campeonato no qual é possível nenhum time jogar duas partidas consecutivas como visitante nem como mandante; mas é mais difícil eliminar um dos 4 pressupostos estabelecidos como verdadeiros no exemplo da demonstração de que a raiz de 2 é irracional. Releia os pressupostos e tente imaginar a quebra de algum deles. Não precisa voltar no texto, já que você se esforçou pra chegar até aqui pode deixar que eu os copio e colo de novo:
1) Um número inteiro elevado ao quadrado resulta em um número inteiro. Em outras palavras, se x é um número inteiro então x² também é um número inteiro.
2) Todo número que pode ser escrito como sendo o dobro de um número inteiro é um número par. Em outras palavras, se x pode ser escrito como 2y (onde y é um número inteiro) então x é um número par.
3) Se o resultado do quadrado de um número inteiro for par, então este número é par. Em outras palavras, se elevarmos um número inteiro x ao quadrado e o resultado x² for par, então x é um número par.
4) Toda fração possui uma forma irredutível. Em outras palavras, para toda fração existe uma fração equivalente a/b na qual o máximo divisor comum entre a e b é 1.
E aí, conseguiu pensar em um número inteiro cujo quadrado não é um número inteiro? Em um número par que não pode ser escrito como duas vezes um número inteiro? Em um número ímpar que elevado ao quadrado resulta em um número par? Em uma fração que não possui forma irredutível? É bem mais difícil do que pensar em um torneio no qual os participantes não precisam jogar contra todos os outros, não é? Aí está a grande virtude da matemática: as conclusões são sempre baseadas na veracidade de pressupostos cuidadosamente estabelecidos.
Um outro exemplo de demonstração por absurdo é a prova de um teorema famoso entre os economistas e estatísticos: o Teorema de Gauss-Markov. Dificilmente Gauss e Markov acompanhavam a Série B do campeonato brasileiro masculino de futebol e se indagavam sobre a possibilidade de o torneio acontecer de maneira que as equipes nunca joguem dois jogos seguidos fora de casa, por isso para usar o método de demonstração por absurdo os cientistas foram obrigados a provar que o estimador obtido pelo método dos Mínimos Quadrados Ordinários (MQO) é o melhor estimador linear não-viesado.
O estimador obtido por MQO é um coeficiente que determina a relação entre duas variáveis x e y. A demonstração requer conhecimento prévio de algumas operações envolvendo Esperança e Somatória, por isso talvez alguns conceitos não sejam tão familiares para todo mundo e a demonstração a seguir não fará tanto sentido como fizeram as do regulamento da Série B e a raiz quadrada de 2. Os que quiserem se aventurar na demonstração a seguir podem tentar e os que não quiserem podem pular direto para o último parágrafo, prometo não ficar triste.
Para realizar a demonstração deste teorema foram estabelecidos 5 pressupostos, conhecidos como as Hipóteses de Gauss-Markov. Tomei a liberdade de incluir um sexto pressuposto que, apesar de ser bem intuitivo, é necessário para esta demonstração:
1) Existe uma relação linear entre as variáveis x e y em uma população, de modo que é válida a seguinte equação:
Onde β0 é o parâmetro de intercepto, β1 é o parâmetro de inclinação e u é o erro
2) Da população é possível retirarmos uma amostra aleatória com n elementos. Cada elemento possui um valor para x e um valor para y. O elemento 1 possui valores x1 e y1, o elemento 2 possui valores x2 e y2, o elemento 3 possui valores x3 e y3 e assim por diante até o elemento n, cujos valores são xn e yn. Cada elemento i possui ainda um erro, de maneira que para cada elemento i da amostra vale a relação:
3) Os valores de x devem variar ao longo da amostra, ou seja, não se pode pegar uma amostra na qual todos os elementos possuem o mesmo valor de x. Em outras palavras, a variância de x não pode ser zero.
4) Para qualquer valor de x, o valor esperado para o erro u é nulo. Isso não quer dizer que o erro é nulo para qualquer valor de x, mas sim que o valor esperado para o erro não é nem positivo nem negativo.
5) Para qualquer valor de x, a variância de u é sempre a mesma. Esta hipótese também é conhecida como hipótese de homoscedasticidade e diz que a variância do erro é a mesma para todos os valores de x.
6) A soma de termos quadráticos nunca é negativa
Antes de prosseguir, vamos retomar alguns conceitos sobre os estimadores de MQO. Através do método dos mínimos quadrados ordinários chega-se a estimadores β̂0 e β̂1, de modo que é válida a seguinte equação:
Os valores dos estimadores de MQO são:
O valor da variância do estimador de MQO é:
O valor do coeficiente populacional β1 é constante, assim o valor da variância diz respeito somente ao restante da expressão. Lembrando também que a variância está sendo calculada para um dado valor de x, podemos passar os termos que dependem de x para fora da variância:
Lembrando da hipótese da homoscedasticidade, que garante que a variância do erro é a mesma para qualquer valor de x, temos:
Vamos agora criar um outro estimador linear não-viesado, β̃1, que possui a seguinte relação:
Onde wi indica um peso para cada valor de yi. É possível considerarmos ainda que Σwi = 0 e Σwixi = 1, pois as cinco hipóteses de Gauss-Markov nos garantem que somente assim a equação E[β̃1] = β1 (condição necessária para que o estimador seja não-viesado) é válida.
Vamos desenvolver um pouco esta expressão da Variância do estimador. Vale lembrar que, como estamos calculando a variância para um determinado xi, o termo wi (que é constante para um determinado xi) pode ser passado para fora da variância:
Adicionando e subtraindo o mesmo termo temos:
Desenvolvendo o quadrado perfeito temos:
Separando as somatórias e trazendo a constante σ² para fora temos:
Utilizando a propriedade distributiva no termo do meio temos:
O termo em função de xi pode ser tirado para fora das duas últimas somatórias:
No termo do meio aplicamos a propriedade distributiva e no último termo cancelamos o termo do numerador com o termo quadrado do denominador:
Lembrando que Σwi = 0 e Σwixi = 1 , temos que:
Agora que já sabemos o valor da variância tanto de Var(β̂1) quanto de Var(β̃1), vamos fazer uma afirmação hipotética:
Existe um estimador linear e não-viesado, β̃1, cuja variância é menor do que a variância do estimador de MQO, β̂1.
Em seguida vamos ver aonde esta afirmação hipotética vai nos levar:
Reparem que cada termo dentro da somatória é um número elevado ao quadrado, portanto temos a somatória de vários termos quadráticos resultando em um número negativo, algo que está em desacordo com o pressuposto número 6.
Assim chegamos a um absurdo, o que nos leva ao quarto e último passo, a negação da afirmação feita e a comprovação do Teorema de Gauss-Markov:
Não existe um estimador linear e não-viesado, β̃1, cuja variância é menor do que a variância do estimador de MQO, β̂1.
Em outras palavras: o estimador de MQO é o estimador linear não-viesado que tem a menor variância.
Demonstrações por absurdo servem para provar teoremas dos mais diversos tipos e com os mais diversos graus de complexidade. O método de supor uma condição contrária ao que se quer afirmar e provar que tal suposição levará a algo absurdo é uma ferramenta que pode ser usada não apenas para a demonstração de teoremas, mas em diversas situações da vida cotidiana. Demonstrações por absurdo são um excelente exercício de raciocínio e um ótimo formulador de argumentos, uma vez que estes são tão mais difíceis de serem refutados quanto mais bem estabelecidos forem os pressupostos e quanto mais bem detalhados forem os passos que levam ao absurdo. Se em alguma situação da vida você se encontrar em um dilema e estiver se perguntando se algo é válido, pense: “O que aconteceria se o exato oposto fosse verdadeiro?” A resposta para esta pergunta pode ser a chave para provar que aquilo no qual você havia pensado era de fato verdadeiro.